Quando o performático Hélio Oiticica com sua obra penetrável “Tropicália” escandalizou a sociedade carioca com uma arte interativa e uma televisão fora do ar, mal sabia que estava dando pontapé inicial de um dos maiores movimentos culturais do país, o Tropicalismo.
Toda irreverência ácida contida na peça única serviu não apenas de inspiração para o nome, mas concedeu a tônica exata da estética para a quebra de um grande paradigma.
É neste contexto que em 1967, Caetano Veloso pesa a mão na escrita e compõe, com dedilhadas e sussurros, um hino que marcaria seu tempo. A repressão militar e as constantes perseguições aos artistas da época não calaram o músico, que ao contrário, criou na letra um afago inverso.
“Tropicália” canção do músico baiano trata de Brasília, critica o sistema, questiona valores. Colocando-se como centro do universo, Caetano ganha poderes utópicos contra os barões do governo. Acima dele, só os aviões.
Neste carnaval, como foliões errantes as letras T e A se escondem da grafia correta de bossa e palhoça. As sílabas ganham vida e orquestradas com maestria pela voz do poeta, disfarçam. Atentar-se a letra de Tropicália é como enchergar o que ninguém quer deixar ver . As metáforas confundem, a musicalidade da canção é um joguete da mente.
Para ele, é como se nem as curvas projetadas por Niemeyer salvasse o Planalto Central. No centro do país, longe de tudo, escondida, branca e pálida está ela. Não tem porta e fica em uma rua antiga, estreita e torta. Não adianta bater, ninguém vai abrir.
Evidenciar a mulata (ta ta) , a Bahia (ia ia) e a Iracema (ma ma) é ocultar que as armas estão empunhadas, a dor pulsa e o alvo é constante. Como na obra originária de Oiticica, a televisão ganha destaque como o ópio que ilude e mascara a real verdade para a massa trabalhadora. Que tudo mais vá pro inferno, meu bem...
Talento, criatividade e ousadia. Quiçá soubesse que seria um dos maiores artistas do país.